Para além dos desafios inerentes ao corajoso ato de empreender, a jornada de uma startup se inicia com a tomada de uma importante decisão: a escolha do tipo societário da empresa. Embora num primeiro olhar possa parecer uma mera burocracia, essa decisão pode afetar diretamente o destino do negócio, especialmente no que diz respeito à capacidade de atrair investimentos.
São várias as espécies empresariais, com siglas e particularidades jurídicas distintas. Duas, porém, merecem destaque, por serem as mais comuns no ecossistema brasileiro: a sociedade limitada (LTDA) e a sociedade anônima (S/A).
Historicamente, se consolidou na mente dos empreendedores a ideia de que a LTDA é uma forma bem simples de organização empresarial, indicada para o início da vida de uma startup, ao passo que a S/A, mais burocrática e custosa, seria inadequada para os estágios iniciais da empresa, não raro marcados por limitação de recursos.
Apesar de acertada em alguma medida, essa percepção se construiu sobre um panorama jurídico que foi bastante alterado nos últimos anos, culminando na aprovação do Marco Legal das Startups (Lei Complementar nº 182 de 2021). A nova lei instituiu regras que deixaram mais simples, fácil e barato a criação e gestão de uma S/A, tornando esse modelo societário mais atraente e vantajoso para todas as fases de uma startup.
Pensando em descomplicar esse assunto, elaboramos uma lista com 6 boas razões para converter uma LTDA em S/A. Confira abaixo:
#1_ Redução de Custos após o Marco Legal
Mundo afora, a limitação de recursos é uma constante nos primeiros passos de uma startup. Nesse contexto, a necessidade de a S/A fazer as publicações obrigatórias em diários oficiais e jornais de grande circulação impunha um custo alto e proibitivo para a maioria das empresas.
Visando desonerar a operação da S/A, o Marco Legal prevê que todas as companhias fechadas com receita bruta anual de até 78 milhões de reais poderão fazer as publicações obrigatórias de forma eletrônica.
Na mesma lógica de abandonar a mídia física em favor da digital, criou-se a possibilidade de companhia fechada na mesma faixa de receita (R$78MM) substituir os livros societários em papel por registros digitais – reduzindo ainda mais os custos para a manutenção de uma S/A.
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#2_ Governança corporativa robusta
Com a crescente valorização do ESG nos mercados globais, a governança passou a ser um dos mais importantes critérios usados pelos investidores para escolher as empresas nas quais investir.
Nesse contexto, a estrutura de uma S/A oferece uma estrutura de governança e gestão muito mais sólida e consistente, fundada em instrumentos e práticas que asseguram a transparência na condução do negócio.
A S/A é composta por uma assembleia geral de acionistas, conselho de administração, diretoria e conselho fiscal. Embora as companhias de capital fechado não sejam obrigadas a manter ativos o Conselho de Administração e Conselho Fiscal, a existência desses órgãos é vista com bons olhos pelo mercado, pois denota uma governança sólida. Entenda o que são cada um desses órgãos de supervisão e administração:
- Assembleia Geral: órgão deliberativo máximo da estrutura da sociedade anônima, pode discutir, votar e deliberar sobre qualquer assunto, inclusive sobre questões administrativas do dia a dia. É composto pelos acionistas que detém ações que gozam de direito a voto. Embora possa tratar sobre qualquer assunto pertinente à sociedade, na prática costuma ser convocada apenas para tratar de assuntos em que a lei assim o determina. O artigo 122 da LSA define os assuntos a respeito dos quais a Assembleia Geral tem competência privativa.
- Conselho de administração: eleito pelos acionistas com direito a voto, pode ser composto por acionistas e não acionistas. Tem função de natureza prospectiva, voltada para a deliberação geral dos negócios, como direcionamento estratégico, entre outros, além de eleger e supervisionar a atuação da diretoria. Como forma de proteger os acionistas minoritários e lhes assegurar representação no Conselho de administração, a lei prevê instrumentos como o votação proporcional (na qual todos os cargos do Conselho de Administração são preenchidos em uma única eleição de acordo com os candidatos mais votados) e voto múltiplo.
- Diretoria: eleita pelo conselho de administração, tem a incumbência de dirigir a empresa e representar a pessoa jurídica nos atos e negócios. Após a promulgação do Marco Legal, o número mínimo de diretores foi reduzido de dois para apenas um, como forma de simplificar a constituição de startups, que geralmente contam apenas com os fundadores.
- Conselho fiscal: trata-se de órgão de existência obrigatória, mas de funcionamento facultativo. Em outras palavras, pode permanecer inativo até que a Assembleia Geral decida instalá-lo. Pode ter de três a cinco membros, eleitos pela assembleia geral. Tem a função de assessorar a assembleia geral na votação de matérias ligadas à regularidade dos atos de administração da companhia.
Essa pluralidade de órgãos de administração e supervisão fortalece a fiscalização das atividades da companhia, sinalizando ao mercado que a empresa é administrada de forma responsável, compatível com seu estatuto social e em prol dos interesses dos acionistas.
Parte importante da governança corporativa envolve também uma gestão organizada e clara do cap table, de modo que seja possível acessar todas as informações societárias do negócio de forma centralizada.
#3_ Flexibilização na distribuição de dividendos
De acordo com antiga redação da Lei das S/As (antes do Marco Legal das Startups), metade do lucro líquido de um Sociedade Anônima deveria ser distribuído aos acionistas. Essa rigidez na distribuição dos dividendos sempre foi uma das principais preocupações do empreendedor que cogitava a conversão de LTDA para S/A. Por um lado, ele se via no dilema de precisar do arcabouço e estrutura da S.A. para captar investimentos e crescer e, por outro, não ter maturidade e musculatura suficiente para distribuir dividendos.
Felizmente, com a aprovação do Marco Legal das Startups, o regime de distribuição de dividendos pelas S/A foi bastante flexibilizado.
Para as companhias com receita bruta de até 78 milhões de reais, a nova lei excluiu a obrigatoriedade de distribuição de metade do lucro líquido do exercício.
Essa modificação favorece o desenvolvimento das startups, pois possibilita à Assembleia Geral deliberar livremente sobre distribuição de dividendos, na ausência de disposição contrária ou omissão do estatuto social.
Assim, em lugar da distribuição obrigatória, a nova regra permite que as companhias concentrem recursos no desenvolvimento do negócio.
Vale ressaltar, contudo, que o Marco Legal prevê a ressalva de que, havendo distribuição de dividendos, os titulares de ações preferenciais não poderão ser prejudicados.
#4_ Maior proteção ao patrimônio dos acionistas
Uma das principais características da S/A diz respeito à limitação da responsabilidade dos acionistas ao preço de emissão das ações adquiridas ou subscritas.
Em outras palavras, o preço de emissão é o máximo que o acionista pode vir a perder caso a empresa decrete falência. Ou seja, como regra geral, o patrimônio pessoal do acionista não responde pelas dívidas da companhia.
Em termos comparativos, a responsabilidade dos acionistas nas S/A é ainda mais limitada do que a responsabilidade no âmbito das LTDAs, em que quotistas respondem de forma solidária pela integralização do capital social de toda a empresa.
#5_ Maior atratividade e segurança para os investidores
A partir da vigência do Marco Legal das Startups, a legislação ganhou clareza quanto à disciplina jurídica aplicável aos instrumentos de investimento em startups, atendendo a uma antiga demanda do mercado por maior segurança e previsibilidade.
As startups poderão receber investimentos de pessoas físicas ou jurídicas, sendo que o investidor não será considerado como integrante do capital social da startup, desde que: (i) o investimento seja realizado por meio de instrumentos em que o investidor não integre formalmente o quadro de sócios da startup; e/ou (ii) não tenha subscrito qualquer participação representativa do capital social da startup.
Os instrumentos com tais características e que comumente são celebrados nesse tipo de operação são: contrato de opção de subscrição de quotas ou ações, contrato de opção de compra de quotas ou ações, debênture conversível emitida pela startup, contrato de mútuo conversível em participação societária, investimento via Sociedade em Conta de Participação e contrato de investimento-anjo.
Seguindo a mesma lógica de resguardar o investidor, o artigo 8º estabelece que aqueles que realizarem aportes por meio desses instrumentos não responderão pelas dívidas da empresa investida.
Com a nova regulamentação trazendo segurança patrimonial, o aporte em startups estruturadas como S/A vem ganhando a preferência dos investidores.
#6_ Maior segurança na emissão de stock options
Com a disputa por talentos cada vez mais acirrada, muitas empresas têm dado a seus colaboradores a oportunidade de comprarem ações do negócio, por meio de programas de stock options (opção de compra de ações).
Embora seja prática corrente no mercado, a emissão de stock options nas Ltdas não tem previsão na legislação brasileira. Dessa forma, apesar de comum, essa conduta não está livre de riscos.
Por outro lado, no que diz respeito às S/As, a criação de planos de stock options se mostra muito mais segura, pois está expressamente prevista no parágrafo 3º do artigo 168 da Lei das S/A.
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